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Varela – obras do heterologos rosiano

sexta-feira 27 de junho de 2025

[...] seja Grande sertão: veredas, seja Tutaméia, culminando no conto A terceira margem do rio de Primeiras estórias, sobremaneira expressivo do pensamento de Guimarães Rosa   e do heterologos em geral. Enquanto Grande sertão nos sugere a imensidão da terra brasileira, o sertão-macrocosmos, “lugar de latifúndios e epopéias”, como diz Gilberto Mendonça Teles, Tutaméia é “uma espécie de ‘grande sertão’ fracionado em pequenas narrativas”, o microcosmos onde decorre o infinitamente pequeno dos personagens  , os seus anseios e “miseriazinhas”. “A ‘nonada’ do romance encontra o seu paralelismo na ‘tutaméia’ nos ‘ossos de borboleta’ do livro   de contos” [1]. Destacaremos sobretudo os prefácios de Tutaméia, os quatro pilares (sugerindo os quatro elementos) de um   corpus de quarenta estórias, heterodoxa e esotericamente contadas e dispostas, porquanto nos parecem constituir o prólogo do heterologos rosiano, senão mesmo a súmula da sua filosofia   arcana, ainda que impura, profunda. O pensamento heterodoxo em língua   portuguesa, as coordenadas ônticas do mal  , do tempo   e do nada  , do terceiro incluído e de um ser   selvagem, recicladas num espírito de lugar, ex libris do imaginário brasileiro - o limite ilimitado da terra - parecem-nos sobremaneira expressivas nestas obras, graças a uma lógica sem exclusões, em que tudo   se inclui, retorna e recria na plasticidade da língua e na energeia do mythos.


Maria Helena Varela. O heterologos em língua portuguesa : elementos para uma antropologia filosófica situada. Rio de Janeiro : Espaço e Tempo, 1996


[1Teles, Gilberto Mendonça. A crítica e o romance de 30 do nordeste. Rio de Janeiro, Atheneu Cultura, 1990. p. xi.