É assim que as elites degeneram e se suicidam.

Mas, em momentos cruciais da história, sob o impulso dos “deuses” e dos “heróis”, elas se reconstituem. No final do ciclo involutivo aparece a “raça de diamante” que sobe a corrente da degradação para se libertar — o que nos permite completar o quadro precedente (p. 12) da seguinte maneira:

  1. DIAMANTE. Dominante: Júpiter.

Reprise do contato com a Fonte divina; interiorização progressiva desta Fonte, no coração da nova raça.

Elite de heróis, de sábios, de Filhos de Deus. Reino do Olimpo.

Ver a virtus Deificatio.

Tipos: Hércules, Eneias.

Eneias, de fato, representando esta raça de DIAMANTE, superará o FERRO (cf. VIII, 364: Aude contemnere opes), o BRONZE (cf. VIII, 621: fatiferum ensem; 704-5), a PRATA (cf. VIII, 533: Ego poscor Olympo; 615-6: contato pessoal com a Fonte divina, e arma radiantia. Vitória sobre Juno: I, 281; VIII, 59-61, etc.), refundirá um novo OURO (cf. VI, 851-2: regere imperio populos, pacique imponere morem), e sairá do determinismo cíclico pela deificação (cf. VIII, 364-5; XII, 167; 794-5: tema da heliomorfose).

Para que se forme e que se imponha uma nova minoria criativa, as “elites” precedentes devem, em grande parte, desaparecer. No poema virgiliano, a morte de Príamo, de Rifeu, de Creúsa, de Palinuro, de Miseno, de Niso e de Euríalo, de Palante, de Amata, de Turno, e de tantos troianos e italianos — encarnando as antigas mentalidades, as estruturas de outrora, o apego a um mundo passado — é necessária ao nascimento de algo mais importante que Troia e que a Itália original. Subsiste apenas um “pequeno resto” (cf. III, 87), em quem sobrevive a verdadeira Troia (cf. II, 241: diuom domus Ilium) — imortal enquanto “forma” do Espírito divino (cf. VIII, 37) —, mas vivificada por uma inspiração e um dinamismo novos. São eles que, detentores do fogo eterno de Vesta — simbolizando a potência soberana da Tradição, a luz do Sol supremo, e a capacidade indefinida de ressurreição —, são destinados a instaurar um novo ciclo e a fundar um novo centro espiritual (cf. I, 206; III, 462, etc.).

Para que este princípio-germe de grandeza se atualize, dois fatores devem intervir: o impulso criativo e o desenraizamento. Estes são, na Eneida, temas fundamentais. O imperativo transmutador se desdobra como um motivo musical incessantemente retomado, através das interpelações divinas, dos sinais celestes (cf. o meteoro de II, 692 sq.), dos prodígios, das tentações e das conversões humanas, dos sonhos, das provas, dos encontros. Preciso e fulgurante como a flecha de Aceste (V, 525 sq.) — que figura aliás o sucesso da teurgia do fogo —, irresistível e paciente como a ação de Vênus, este imperativo visa a junção do aqui-em-baixo e do além, à transfiguração do real, ao retorno entre os homens da presença divina (Pax = Schekhinah). Quanto ao desenraizamento, de tipo quase abraâmico, ele se traduz principalmente por uma série de partidas que são outros tantos despertares, e nesta “ascese do mar” imposta a Eneias por Júpiter como a prova libertadora por excelência (IV, 237: Nauiget!). Mas, fato capital, este desenraizamento, esta passagem através do fogo, das tempestades, dos “infernos”, das guerras, é no fundo um novo enraizamento no céu e na terra, segundo o belo verso I, 380 (Italiam quaero patriam et genus ab Iove summo), ou seja, a chave de uma nova manifestação de uma herança ancestral, de uma reconstituição, sobre melhores bases, de uma muito antiga elite com vocação universal.


PS: Yves Albert Dauge. Virgile. Maître de Sagesse. Essai d’ésotérisme comparé. Milano: Archè, 1983